Apenas uma garota - Meredith Russo

>>  quarta-feira, 13 de setembro de 2017

RUSSO, Meredith. Apenas uma garota. Rio de Janeiro: Editora Intrínseca, 2017. 240p. Título original: If I was your girl.

“Desejei ir andando até o céu e morar em algum planeta distante, bem longe das coisas que me assustavam. Eu me perguntei se era possível sentir alegria pura, que não estivesse maculada por medo e incertezas, ou se algum nível de tristeza era uma constante universal, como a velocidade da luz.” p.63

Tirando os livros do David Levithan não lembro de ter lido outros livros de literatura LGBT, e ainda não havia lido nada sobre um personagem transexual. O tema é interessante, a narrativa deliciosa. Confira o que achei sobre Apenas uma garota da Meredith Russo.

Amanda Hardy, 18 anos, acaba de se mudar para a pequena cidade de Lambertville, para morar com o pai. Ela não vê o pai faz muitos anos, desde o divórcio ele se afastou. E não entrou em contato nem quando ela mais precisou, quando estava no hospital, depois de quase morrer tentando tirar a própria vida. Na época Amanda ainda era “Andrew”, um menino com o nome que recebeu dos pais ao nascer. Amanda nunca se sentiu como um menino, desde criança na escola, ela sonhava em ser uma menina, usar roupas de menina e ter o corpo e o cabelo como o de uma menina. Mas o processo de aceitação, de mudança, foi longo e doloroso. Agora ela tinha feito as cirurgias, estava tomando medicação e para qualquer um que não a conhecesse antes, ela era apenas mais uma adolescente.

E é como uma menina que todos a veem na nova escola. Pela primeira vez, ela pode ser Amanda, somente Amanda. Porém, além de ser vista com uma menina, seu maior sonho, ela também precisa aprender a se aceitar e ser feliz. Ela tem medo do passado, pavor do que pode acontecer se alguém descobrir “o que” ela é. Amanda só quer deixar o passado para trás, faz novas amigas e pela primeira vez em sua vida, descobre o que é felicidade. Até que ela conhece Grant, um rapaz diferente de todos que conheceu no passado. Ele é fofo, íntegro, carinhoso. Mas será que ela pode se envolver e se apaixonar por alguém sem contar a ele sobre o seu passado? E se contar, será que ele ainda a olharia como antes?

“- Pessoas como você são assassinadas por pessoas como ele.
-  Grant não é assim - argumentei, e minha voz soou fraca e distante.
- Você não entende mesmo, não é? Meu Deus, eu ainda me lembro daquela carta que você mandou quando começou a tomar hormônios, dizendo que sempre foi uma menina. Na época, eu não entendi, mas agora acho que entendo porque você está agindo feio uma garota. Está agindo que nem uma garotinha que está tão apaixonada a ponto  de não conseguir pensar direito.” p.117

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Forte, fofo, comovente, doce e ao mesmo tempo amargo. Esse livro é uma montanha russa de emoções. Eu adorei a leitura, sofri em cada página, pelo passado da Amanda, pelo presente que parecia tão frágil. Eu queria colocar Amanda em um potinho e protegê-la. Eu não sei se foi pela narrativa em primeira pessoa, ou pela construção da história que já começa após ela fazer a mudança de gênero, mas em nenhum momento eu consegui enxergar Amanda como um menino. Ela é uma menina, com todas as dúvidas e anseios de uma adolescente, porém com um passado traumatizante.

Aos poucos a autora conta em flashbacks algumas cenas do passado de Amanda, até então, Andrew. Do bullying na escola, dos constantes espancamentos. Do desespero dela ao perceber como ficaria seu corpo com a puberdade, o que levou Andrew a tentar se matar. E depois a terapia, a aceitação de que ela era uma menina e a cirurgia e remédios que possibilitou que ela se tornasse Amanda. De como o pai abandonou a mãe para lidar com tudo isso, e não apareceu nem quando ela estava no hospital. E depois de um trauma enorme na cidade em que vivia (onde todo mundo sabia que ela era menino, e agora não era mais etc), ela vai morar com o pai, em busca de um novo começo. Os pais dela são ótimos! Claro que uma situação dessa é inimaginável para quaisquer pais, mas eles tentam. A mãe tenta compreender, aceita. O pai vai melhorando no decorrer do livro, mas dá para entender o lado dele.

Quando chega a nova escola, tudo o que Amanda quer é estudar tranquilamente, sem que ninguém saiba de seu passado, se formar, ir para uma faculdade bem longe e então ter a vida que sempre sonhou. Mas nada é assim tão simples, ela logo faz amizades, conhece várias meninas e um menino especial. Ao se envolver com Grant ela coloca em risco seu segredo, e ninguém sabe o que pode acontecer, se o passado for revelado.  

A autora conta no final que simplificou a mudança para que Amanda fosse vista e entendida como uma menina, para que de certa forma ela fosse melhor aceita pelos leitores cisgênero (aqueles que não são trans). Ela nunca teve dúvidas, sempre se viu como uma menina, fez a cirurgia e começou a tomar os hormônios muito cedo (algo que segundo ela seria muito difícil na vida real), o que facilitou para que ela não tivesse nenhum traço masculino. Se isso é “facilitar” eu fico triste em pensar de como seria na realidade para uma pessoa que quer tanto essa mudança. E ela conseguiu com sucesso construir um personagem complexo, mas completamente feminino. Fez com que eu torcesse para Amanda do início ao fim. E temer por ela, de certa forma eu sabia que ia dar merda no final, e deu rs. Ah outra coisa interessante, a linda modelo da capa, Kira Conley, é uma modelo trans.

Falando de final, foi a única coisa no livro que não curti. O final foi muito aberto. Eu queria mais, um final redondinho, um epílogo… algo alguns anos depois, sei lá, qualquer coisa menos a forma que foi rsrs.

Esse livro é daqueles que fazem o leitor refletir. Aborda bullying, preconceito, autoaceitação. Faz com que a gente pare para pensar em como enxerga as diferenças, e até que ponto você seria uma dessas pessoas que julga, que aponta o dedo e que ri das diferenças. Leitura mais do que indicada, eu adorei a leitura e indico sem dúvidas. Quem leu me conte o que achou, leiam!

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