O pior dos crimes - Rogério Pagnan

>>  quarta-feira, 2 de maio de 2018

PAGNAN. Rogério. O pior dos crimes. Rio de Janeiro: Editora Record, 2018. 335p.


Um livro “jornalístico”, de reportagem e investigação, jamais havia passado pela minha lista de desejados. Até ver a capa desse livro e saber do que se tratava. Não se trata hoje de dizer para vocês apenas o que achei da história, mas mostrar também como a narrativa me fez reviver os sentimentos em relação ao caso, que no dia 29 de março deste ano completou 10 anos.

Alexandre Nardoni é filho de Antônio e Cida e nasceu em um momento de crise financeira da família, crise essa que, com o passar dos anos, foi moldando a personalidade de Alexandre, que se mostra sempre muito interessado em dinheiro e vivendo na ilusão de ser muito abastado em relação às outras pessoas, gostando de jogar isso na cara delas.

Ana Carolina de Oliveira é uma moça de classe média, um pouco “cabeça de vento”, que se apaixona por Alexandre e tem com ele uma filha, apesar de o relacionamento não ter  dado certo. O sonho dele era que a filha nascesse no dia do aniversário de sua mãe e se chamasse Pâmela, mas nada disso aconteceu, já que a menina nasceu no dia seguinte ao aniversário da avó paterna e recebeu um nome completamente diferente: Isabella.

No mesmo dia em que o relacionamento entre Alexandre e Ana Carolina termina, coincidência ou não, ele começa a sair e a namorar com Anna Carolina Jatobá.

Anna é uma moça de pais com condição financeira oscilante e se rebela contra eles para ir morar com o namorado. Acontece que ela é jovem, mimada, não lava nem o copo que usa. Ela entra em desespero, porém, quando vai morar com Alexandre, porque não só tem que lidar com uma casa para cuidar, como também com o fantasma do antigo relacionamento dele: Carol e o fruto desse amor, Isabella.

Entre altos e baixos no relacionamento, Alexandre e Anna vão seguindo a vida com os dois filhos do casal e Isabella, que vive com a mãe, mas costuma ir para a casa do pai a cada 15 dias. Contudo, quando se trata da mãe de Isabella, tudo muda de figura, ainda mais depois que Carol requereu, por meio de processo judicial, o pagamento de pensão alimentícia para Isabella.

Até que, na noite do dia 29 de março de 2008, a polícia militar de São Paulo recebe uma chamada desesperada de um vizinho do apartamento de Alexandre Nardoni e Anna Carolina Jatobá, informando que uma criança havia sido jogada do sexto andar do prédio.

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O livro é organizado por partes, da seguinte forma: 1. Fala sobre o acontecimento; 2. Fala sobre a origem de Alexandre, Anna Carolina Jatobá e Ana Carolina Oliveira; 3. Fala sobre a investigação; 4. Sobre a perícia; 5. Sobre o julgamento; e 6. Sobre a condenação. Todas são autoexplicativas.

O autor escreveu a história aparentemente em forma de thriller utilizando depoimentos e documentos extraídos do processo criminal, bem como as entrevistas dadas exclusivamente a ele por envolvidos e testemunhas do crime. Digo “aparentemente” porque, apesar da tentativa, não acho que, puxando pela memória, o livro tenha ficado exatamente como os thrillers que já li.

Esse fato é compensado pelo perfeito encaixe do contexto dentro dos capítulos. É visível o estudo detalhado feito pelo autor em relação ao processo, a fim de organizar os pontos e colocá-los de forma a ficarem mais claros e conexos para o leitor.

Assim, temos uma linha do tempo invisível traçada ao longo do livro, começando pelo passado dos acusados e da mãe da vítima até a vida no presídio após a condenação de Alexandre Nardoni e Anna Carolina Jatobá.

Por meio das entrevistas concedidas por familiares, vizinhos, peritos, policiais e delegados envolvidos no caso é possível observar com clareza a sequência de erros cometidos, desde o momento em que a primeira chamada foi feita para a polícia com o pedido de ajuda.

As atitudes relatadas pelos peritos, por exemplo, mostram o verdadeiro descaso no trabalho de periciar o local do crime. Tudo poderia ter sido analisado de forma mais detalhada, atenta, e talvez o caso tivesse tomado rumos diferentes. Ou até mesmo um rumo de fato, pautado em uma fundamentação melhor, tendo-se mais certeza da autoria do  crime cometido pelo pai e a madrasta. Há, ainda, atitudes absurdas como a briga entre o 9º distrito e o DHPP para ver quem conduziria a investigação, apenas por se tratar de um caso de grande repercussão.

Fato é que, mesmo após toda a leitura do livro, não consigo acreditar na versão dos acusados de que alguém entrou na casa e jogou a menina pela janela. Como isso seria possível sem um arrombamento? Como alguém entraria na casa simplesmente para jogar Isabella pela janela e ir embora? Até então, nada na história faz pensar que Alexandre tivesse inimigos tão mesquinhos.

Outro detalhe que me deixou espantada foi a precariedade e o quase amadorismo da perícia técnica para analisar a cena do crime. Investigam um sangue que pode não ser sangue, e se for, pode não ser da menina; há um machucado na testa de Isabella que pode ter sido feito por uma tetra chave que jamais foi levada para ser periciada.  

Ou, ainda, o laudo do instituto médico-legal que aponta a causa da morte como indeterminada, porque o corpo da vítima não tinha lesões suficientes que indicassem que a queda de cerca de 20 metros foi o que casou a morte; e, apesar dos hematomas que foram deixados em seu pescoço, não se pôde precisar de quem era a mão que fez tal marca na menina e ficou por isso mesmo.

Essas são apenas pequenas amostras da quantidade de absurdos que são trazidos pelo autor, descobertas e apuradas ao longo dos anos até o lançamento desse livro. 

O livro peca apenas na repetição das narrativas, já que o evento-chave – a morte de Isabella – e o depoimento das partes envolvidas são repetidos quase à exaustão ao longo do livro, tornando a leitura cansativa e morosa em determinados momentos.

É importante lembrar que nesse caso não há um desfecho a ser revelado, tampouco spoiler em qualquer informação que se dê. Não há quem eu conheça que não tenha passado horas na frente da TV acompanhando o caso Nardoni.

Logo, não vejo nenhum problema em lembrar que ainda com todo o problema na investigação da morte, tanto o pai, quanto a madrasta foram condenados pela morte de Isabella Nardoni, sendo que ele foi condenado a 31 anos, 1 mês e 10 dias de prisão, enquanto ela foi condenada a 26 anos e 8 meses de prisão, somando-se, ainda, a pena de 8 meses pela fraude processual.

Há quem diga que os dois condenados são inocentes e que as penas foram injustas. Para outros, a condenação não foi o suficiente para tanta maldade, já que nada pode trazer Isabella de volta à vida. Eu só acho que, após a leitura desse livro, concluo que as falhas são tantas que prefiro guardar para mim a ignorância sobre o caso.

Por fim, digo que se você gosta de um livro “jornalístico”, é uma boa pedida. Advogados e estudantes de Direito que curtem a área criminal vão adorar! É um livro que abre o olhos principalmente em relação à forma como a polícia e o serviço investigativo são precários no Brasil, bem como a aplicação fraca da lei, já muito obsoleta em vários pontos. Portanto, merece ser lido!

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Avaliação (1 a 5): 3,5
 







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