Casa de alvenaria - Volume I: Osasco - Carolina Maria de Jesus

>>  quarta-feira, 6 de abril de 2022


JESUS. Carolina Maria de. Casa de alvenaria - Volume I: Osasco. São Paulo: Companhia das Letras, 2021. 220 p.


Há cerca de duas semanas trouxe para vocês a resenha de Quarto de despejo, livro que traz o relato da vida de favelada de Carolina Maria de Jesus. Agora, trago para vocês a continuação desse livro. Confiram o que eu achei de Casa de Alvenaria -vol 1: Osasco.


No finalzinho de Quarto de despejo, sabemos que Carolina foi descoberta pelo jornalista Audalio Dantas,  que dá todo apoio e caminho para lançamento do livro que mais que relata, denuncia a vida na favela.

Em Casa de Alvenaria - Volume 1: Osasco, temos Carolina tendo seu trabalho como escritora reconhecido e, mais do que isso, rendendo frutos e dinheiros.

Ela e seus filhos se consideram ricos, pois agora têm comida na mesa, um chuveiro quente, energia elétrica e uma cama confortável para dormir. Eles passaram a residir de favor em uma casa na cidade de Osasco.

"Ela diz: agora nós somos riços porque temos o que comer, ate encher a  barriga. E da risada. Vendo-a sorrir eu fico contente e penso em Deus, ele escreveu outra peça para eu representá-la no palco da vida. Aquela peça de morar na favela e ouvir aquela canção que o custo da vida compôs. Eu estou com fome!" p. 48

Carolina agora precisa viajar com frequência para promover seu livro, continuar escrevendo seu diário e, além disso, cuidar de seus filhos que estão cada dia mais rebeldes e arteiros.

Apesar de todo o dinheiro, todo o conforto e reconhecimento de seu trabalho, Carolina não está feliz.

Primeiro, porque ela esperava que fosse continuar a ler o mesmo tanto que lia e que ia poder escrever sobre o que quisesse, mas a verdade e que não lhe sobra tempo para ler e ela deve continuar escrevendo os diários e isso a incomoda muito.

Além disso, ela se sente cansada de viajar para lá e para cá e fica preocupada porque na maioria das vezes seus filhos precisam ficar sozinhos. Deixá-los com os vizinhos é impossível, porque eles os maltratam,  sobretudo por serem negros.

E isso é o terceiro ponto de tristeza para Carolina. Apesar de ter chegado onde chegou, ela segue sofrendo preconceito, discursos de ódio, e apesar de parecer que ela não liga para isso, a abala muito.

Para piorar,  ela recebe muitos pedidos de ajuda financeira das mais variadas pessoas e os mais criativos pedidos, o que a incomoda ainda mais,  pois quando era pobre ninguém vinha lhe incomodar com nada disso, muito menos lhe ajudar oferecendo dinheiro ou ajuda de outra espécie.

"Pensei: ha dinheiro... invenção diabolica e enigmatica que escravisa o homem e liberta o homem. O dinheiro empana a consciência do homem." p. 55

Dessa forma, na minha visão de leitora, Casa de Alvenaria traz uma nota de tristeza em suas páginas, superada quando Carolina se alegra e tem momentos felizes, seja com os filhos, seja com os livros.

O que já havia me impressionado em Quarto de despejo e se agravou ainda mais nesse livro foi a lucidez e a clareza das ideias de Carolina, uma mulher que estudou apenas dois anos do colégio e se pronuncia como ninguém sobre assuntos  como política, educação,  entre outros.

Seus conhecimentos, extraídos dos livros e dos jornais que lia diariamente fica evidente diante das opiniões que expressa no livro, sobretudo sobre a política, que ela critica bastante. Ainda nos mostra a necessidade que ela tinha de adquirir conhecimento para se posicionar no mundo. Serve de inspiração a sempre procurarmos ficar informados sobre o mundo que nos rodeia, principalmente para que não sejamos esmagados por notícias falsas.

Achei muito legal poder acompanhar os lugares e pessoas famosas que ela conheceu ao viajar para divulgar seu livro e fiquei chateada por ela, apesar de ter condições para isso, não conseguir sequer uma empregada que olhasse os filhos de forma decente.

O livro é  recheado a frases bacanas e sábios dizeres de Carolina. Tentei trazer algumas aqui, mas a verdade é que, se pudesse, copiava o livro quase todo nessa resenha, rs.

O triste é perceber que muito do que ela disse em 1960 acontece ainda hoje. Em várias passagens me peguei me perguntando o que ela diria dos dias de hoje se ainda estivesse viva, como na passagem a seguir:


"Naquele tempo, o Brasil era pobre porque o nosso ouro ia para Portugal. - Hoje, o Brasil é pobre porque as verbas do país, não vae para o tessouro. Vae para os bôlsos dos mais politicos, que duplicam dia a dia igual as estrelas do céu. Comparando os politicos da atualidade cp, p saudoso Dom Pedro, ele foi mais distinto. Demonstrou mais amôr patriotivo. Os de hoje são patri-bôlso." p. 95

E uma das passagens que achei mais incrível, quase uma premonição da autora sobre nosso atual governo, kkk:

"Agora o Brasil está sendo governado pelos jotas. Entra J. sae J. Vamos ver o que estes J. vão fazer. Quando saiu o j. e entrou o outro j. o povo ficou reanimado. Comentavam:

- O j. vae fazer isto! Vae fazer aquilo quando voltar da Europa. P j. não é falastrão. Fala que faz, e faz. O j. é concreto. Não é abstrato. Ele vae dêixar o Brasil nivio igual flocos de algodão.

Este é o homem que o Brasil estava aguardando.

Para mim um politico é igual uma nuvem no espaço. Pode ser que desaba como chuva como tempestade, como furacão." p. 147


Além disso, é bacana ver que apesar de ter começado a ganhar direito e saído da pobreza, Carolina ainda se preocupa com os pobres, com os favelados, sobretudo por ter passado pela aterradora experiência de passar fome.

Estou muito curiosa para ler o volume dois de Casa de alvenaria: Santana e, mais do que isso, estou muito curiosa para ler tudo o que Carolina nos deixou.

Indico esse livro para todo mundo! Leiam!

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Avaliação (1 a 5):








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