Léxico Familiar – Natalia Ginzburg

>>  sexta-feira, 27 de abril de 2018


GINZBURG, Natalia. Léxico Familiar. São Paulo: Companhia das Letras, 2018. Título Original: Lessico famigliare.

Sinopse: O romance narra a infância e juventude da escritora, dramaturga, ensaísta e ativista política italiana Natalia Ginzburg (1916-1991). As memórias de sua convivência em uma família burguesa, letrada e judia, em meio ao fascismo e à Segunda Guerra Mundial, são narradas em estilo minimalista. Caçula de cinco irmãos, a menina recria o passado lembrando das frases repetidas em família.

Mais uma vez começo uma resenha sem saber o que escrever. Não sei como definir este livro, que já tão foi explorado pela crítica e mesmo assim nunca um consenso quanto a sua classificação foi alcançado. Seria uma ficção autobiográfica? Um livro de memórias? Crônica? A única unanimidade é a qualidade da obra de Natalia Ginzburg, originalmente publicada em 1963. A italiana é um dos grandes nomes da literatura modernista de seu país, e frequentemente é incluída na lista de escritoras feministas, mulheres fortes e intelectuais que deixaram sua marca numa sociedade cultural predominantemente masculina.

Resolvi ler esse livro quando li a sinopse. Memórias é meu gênero literário favorito, e me traz um carinho e paixão que mal consigo explicar, que beiram o ciúme. A família descrita vira a minha própria, eu me espelho nos casos contados, e volta e meia imagino os personagens (pessoas reais) com semelhanças a meus familiares e conhecidos. O ato de alguém escrever seus causos e histórias, algo tão familiar, me desperta um carinho e uma empolgação que transforma aquele livro em minha vida, em meu relato, e eu viro a narradora. Aquelas viram as minhas histórias, e as vezes me pego as recontando com brilho nos olhos.

Além disso, em relatos memorialísticos e autobiográficos, conseguimos conhecer mais do tempo e da história, e muitas vezes temos cenários muito mais críveis e ricos do que nas histórias descritivas, ou até mesmo aquelas de ficção. Este livro fala da vida da autora na Itália, sua infância e juventude, e em seus relatos temos mais informações sobre a cultura, economia, pensamento, paisagem, geografia e sociedade italiana do que muitos livros de histórias por aí. Seu pai, com as “parvoíces” e a personalidade forte, sua mãe carinhosa e artística, e seus irmãos, não próximos, mas sempre reunidos na lembrança de pequenas frases famosas de personalidades marcantes da família: uma tia louca, um avô mesquinho, uma empregada prestativa, um dia engraçado. Assim a autora vai tecendo seus casos e histórias, com as famosas frases inesquecíveis e marcantes de sua vida, proferida por sua família.

Eu não consigo explicar muito bem o quanto gostei desse livro, e como acho que todos leitores fãs do gênero devem ter nsta belíssima edição em sua estante (se não na cabeceira). É uma questão se sentimento, de ter aquele ciúme de um livro querido, e um medo irracional de alguém não gostar, ou não sentir o mesmo carinho que você sentiu.

Pegamos uma passagem como exemplo:

“Minha avó materna, vó Pina, era de família modesta, e casara-se com meu avô que era seu vizinho de casa: rapazote de olhos grandes, distinto advogado em início de carreira, que ela, todos os dias à entrada, ouvia perguntar à zeladora: - Tem corespondéncia para mim? – Meu avô falava correspondência, com um ‘r’ só e com o ‘e’ aberto; e minha avó achava este modo de pronunciar a palavra um grande sinal de distinção. Foi por isso que ela se casou com ele; (...) Não foi um casamento feliz.” (p. 33)

Após ler a passagem acima, eu ri alto, de gargalhar por uns bons 10 minutos. E como é bom rir alto, soltando som pela garganta, e não com emojis em textos ou mensagens. Após essa boa e necessitada dose de riso, me peguei pensando em diversas tias primeiras, segundas e terceiras que provavelmente se casaram por motivos semelhantes, e que tiveram casamentos infelizes. Mas também algumas deram sorte e foram felizes. E o pensamento vai, viaja, e a minha própria memória familiar foi enaltecida, pela simples distinção ao falar de um senhor, relatado pela autora.

Para mim, ler memórias é ir além das linhas escritas, é pensar “será?” ou “verdade...” ou “como assim?” ou o mais provável de todos, “na minha casa também!”. Memória é algo tão individual, mas que nos faz sentir como uma parte de um todo. São muitas semelhanças para tudo isso ser aleatório, para sermos sozinhos no mundo.

E sim, toda essa reflexão veio por causa do casamento infeliz pela pronúncia de R e E.

E é por isto que eu amo a literatura.

Livros bons nos divertem, e acabam decorando nossas estantes. Livros fantásticos nos emocionam e ficam para sempre marcados em nossas mentes.

Este livro? Incrivelmente fantástico!


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