Arthur & George – Julian Barnes

>>  sexta-feira, 15 de outubro de 2021

BARNES, Julian. Arthur & George. Rio de Janeiro: Editora Rocco, 2007. 442p. Título original: Arthur & George.

Eu confesso que cometi um terrível erro com esse livro. Fiz a aquisição e li todo o livro, inclusive fazendo alguns comentários nas redes sociais sobre ele pensando ser escrito por Julian Fellowes, autor de alguns romances de época e roteirista da série Downton Abbey. Somente ao escrever a referência bibliográfica do livro que descobri se tratar de Julian Barnes, escritor britânico especialista em ficção bibliográfica. Passado o choque inicial do meu erro grosseiro, tudo fez mais sentido: era um livro muito diferente do que eu conhecia de Fellowes, e realmente a história faz mais sentido para um autor com experiência em pesquisa biográfica. Barnes, o autor da obra, publicou outros livros romanceando a vida, obra ou até mesmo casos peculiares de escritores e figuras famosas, e me lembra um pouco o estilo da também inglesa Tracy Chevalier. Trata-se de uma narrativa que pega acontecimentos reais e cria-se uma história com liberdade criativa para “ligar os pontos”, e eu sou fã dessa criatividade baseada em fatos reais. Arthur & George é um exemplar fiel deste estilo literário. 

O livro nos traz uma narrativa ficcional baseada em fatos reais e em muita pesquisa. Temos um caso peculiar na história britânica contado com elementos biográficos ligados por um cenário imaginado pelo autor. A história me fisgou logo na sinopse por se tratar de algo muito interessante e tão envolvente que eu simplesmente precisava saber mais. 

Trata-se da história que uniu dois cidadãos britânicos de mundos muito distintos de um jeito bastante conhecido e público para a época, com consequências que perduraram na história. Temos de um lado George Edalgi, um advogado nascido e criado na Inglaterra e de ascendência indiana, condenado por um crime que não cometeu. De outro, temos o escocês Sir Arthur Conan Doyle, autor de Sherlock Holmes e um dos mais celebrados escritores da época, que recebe uma carta de Edalgi pedindo ajuda para encontrar provas de sua inocência. E então temos o encontro dos dois: um querendo a inocência e ser respeitado na sociedade e o outro procurando aventuras e desafios diante de uma vida que se tornou um pouco diferente do que ele inicialmente previu. 

O livro é dividido em três partes: as duas primeiras se mesclam e contam a história de Edalgi e Conan Doyle, e a terceira trata do caso concreto do trabalho de Conan Doyle como detetive particular para tentar inocentar seu cliente nessa nova profissão que antes só conhecia através de seu famoso personagem. A história de George Edalgi é contada desde o princípio, começando na sua infância como filho de um pastor da igreja anglicana e na sua criação que afastou os costumes e cultura indiana, muitas vezes ignorando (ou não querendo ver) o preconceito pela cor da sua pele e pronúncia do seu nome. 

Peculiarmente, nos anos 1880, quando George ainda era adolescente, a família Edalgi começou a receber correspondências ameaçadoras. A polícia foi contatada e não chegou a uma solução, insinuando que George seria o responsável em um caso de rebelião juvenil (detalhe: George era um menino quieto e obediente, que jamais deu indícios disso). Em 1903, após uma série de mutilação de animais próxima de onde a família Edalgi vivia (crimes conhecidos como Great Wyrley Outrages), o já formado e respeitado advogado de Direito Ferroviário George Edalgi é condenado pelos crimes, apesar da clara ausência de provas. Após receber uma pena de trabalhos forçados e impedido de exercer a advocacia, Edalgi escreveu uma carta para Arthur Conan Doyle, celebrado e famoso autor dos romances de Sherlock Holmes, pedindo ajuda para encontrar evidências que ajudassem a provar sua inocência e pelo menos recuperar o direito de exercer sua profissão. 

Já a abordagem de Arthur Conan Doyle é diferente. Conhecemos um pouco da sua formação universitária na Medicina e o relacionamento com a esposa, Louisa Doyle. Após isso, o livro já foca mais na sua fase após o sucesso dos livros de Sherlock Holmes e, especialmente, seu relacionamento com Jean Leckie. Doyle é descrito como um pouco assustado com a dimensão e o alcance de seus livros e se sentindo culpado por amar uma mulher fora do casamento e tentando conciliar seus sentimentos com a honra da família. Ele sempre recebeu correspondências de fãs que acreditavam ser ele um Sherlock Holmes da vida real, alguns pedindo ajuda e querendo o contratar como detetive particular. Mas foi a carta de Edalgi que o convenceu a tentar a profissão de seu personagem e, quem sabe, tentar se encontrar no processo. 

A história é muito interessante e as circunstâncias são muito peculiares. Foi um prazer acompanhar o desenvolvimento do caso e conhecer mais sobre pessoas reais tão distintas, mas que tanto influenciaram a vida um do outro. Gostei do livro e foi uma leitura surpreendentemente rápida – normalmente eu demoro muito para avançar no gênero biográfico, o que não foi o caso aqui. Eu gostei mais da história da vida de George Edalgi, especialmente antes do julgamento. Nesse ponto, encontro o primeiro problema do livro: a narrativa do julgamento chega a ser irritante de tantas repetições e não é uma leitura muito prazerosa. O autor claramente quis deixar explícito como o julgamento não foi justo e o trabalho falho da acusação, mas não precisava de tantas repetições e tantas descrições. A história de Conan Doyle é interessante, mas eu esperava um pouco mais, pois é feita de um jeito que endeusa a figura do autor como um herói salvador, apesar de todos seus problemas e falhas de caráter, e eu estava ansiosa por conhecer mais seu lado humano, o que o levou a querer imitar Sherlock Holmes. 

Mesmo assim o livro é bom e foi uma leitura que eu gostei e que representa bem o gênero. A história está cheia de casos interessantes que dariam um livro, e eu estou aqui para lê-los!

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Avaliação (1 a 5): 


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