A filha perdida - Elena Ferrante

>>  quarta-feira, 16 de fevereiro de 2022

 FERRANTE, Elena. A filha perdida. Rio de janeiro: Editora Intrínseca, 2016. 174 p. Título original: La figlia oscura.



Desde que li A vida mentira dos adultos venho procurando um pretexto para ler mais livros da Elena Ferrante. Ganhar A filha perdida de presente de natal foi um ótimo deles, não acham? Agora que conheço a história, posso dividir quase todos os meus sentimentos e impressões com vocês. Venham, então, descobrir o que achei de A filha perdida.



Leda é professora universitária, tem 48 anos e duas filhas crescidas. Elas foram para o Canadá morar com o pai e Leda não se sente necessariamente triste com isso. Na verdade, há tanto tempo não se sente livre, sem as demandas das filhas para atender. É como se o "peso" da maternidade tivesse sido tirado de suas costas. Ela vai, então, passar férias em uma cidade litorânea ao sul da Itália e, o que prometia ser um período solitário de descanso acaba se tornando um reencontro com seu passado, seus sentimentos e, sobretudo, com os fantasmas do que foi sua maternidade.


Isso porque Leda conhece uma família napolitana que está passando férias na cidade, que a faz lembrar de sua própria família em que nasceu. Quem mais lhe chama atenção nessa família é Nina, uma jovem e bela mãe que parece uma pessoa perfeita. Ela tem uma filha pequena, Elena, em torno de quem parece que a vida de Nina gira.


Contudo, à medida que vai conhecendo Nina e se aproximando dela, Leda acaba desenterrando segredos, lembranças e medos de seu próprio passado, trazendo à tona coisas que ela preferia nunca mais se lembrar.



"Basta olharmos para a criança e na mesma hora começa o jogo das semelhanças, pois logo nos apressamos a encaixá-la dentro do perímetro conhecido dos pais. Na verdade, é apenas matéria viva, o enésimo pedaço aleatório de carne proveniente de longas cadeias de organismos. Engenharia - a natureza é engenharia, a cultura também, a ciência está logo atrás, só o caos não é engenheiro - e, ao lado dela, a necessidade furiosa de reprodução." p. 45.



Se ao ler esse livro você espera encontrar uma visão bonita e romântica da maternidade, desista. Se tem uma coisa que Elena Ferrante  trouxe com essa história foi uma visão nada romântica do que é ser mãe. Pelo contrário. Traz uma visão realista, contraditória, por vezes desanimadora, por vezes maravilhosa.



Ao terminar essa leitura, a pergunta que me veio à cabeça foi: "Toda mulher nasceu para ser mãe?" Não digo no sentido biológico, apesar de que, infelizmente, até nesse sentido nem todas "nasceram" para ser mãe. Culturalmente, sim, todas as mulheres vieram ao mundo para ser mães. Somos (ou éramos) criadas para isso, desde as bonecas que ganhamos na infância, até o casamento, com os por vezes não tão singelos questionamentos sobre ter ou não filhos. Mas, até que ponto devemos ouvir esses questionamentos? Aceitarmos a pressão de ser mãe? Atendermos o "chamado cultural" da maternidade? Leda é uma mãe para quem a maternidade não é natural. Ela se tornou mãe uma vez porque queria e uma vez por pressão da família. Ela não conseguiu lidar com a perda da liberdade, com o "se doar" por inteiro para duas filhas e se ver sem nem uma migalha de liberdade para si. Não sobrava nada para ela. Isso levou a atitudes e pensamentos que nem sempre eram bonitos, aceitáveis.



Como leitora, foi muito fácil julgá-la. Como mãe, não.

Por vezes, ela se mostrou uma pessoa muito egoísta. Ela mesma assume que o é. Mas, por outro lado, os acontecimentos vão muito além disso. Filhos nos mudam de forma irreversível, física e mentalmente. Uma pessoa morre quando o filho nasce, para nascer uma nova. É uma nova vida. Nem sempre e não a todo momento, por mais preparada que a pessoa esteja, vai ser fácil lidar com essa nova pessoa que nos tornamos, aceitarmos que aquela antiga vida jamais voltará. Talvez, Leda também não tenha sabido lidar.


Deixando um pouco de lado esses questionamentos e delírios sobre a maternidade, uma vez mais a escrita de Ferrante me pegou de jeito e fui devorando cada página. Fiquei irritada com alguns personagens em alguns momentos, tentando julgar o mínimo possível e, às vezes, falhando miseravelmente, rs.


A forma como a autora escreve me faz ter uma visão tão clara do que ela está descrevendo e da situação que, por vezes, é quase palpável. Até mesmo os sentimentos.


Apesar disso, senti falta de alguma coisa na história que me deixou um pouco frustrada, sobretudo no final. Acho que queria mais alguns capítulos (que são bem curtos, por sinal) e um desfecho que não me deixasse com vontade de ligar para a autora e falar com ela: "hum, acho que você se esqueceu de algo."


Ainda restou, ao final, uma outra pergunta: mas quem é a filha perdida nesse caso? A infância das filhas de Leda, que de certa forma, ficou "perdida" com a forma com que ela lidou com a maternidade? A própria Leda, em relação à própria infância e o medo que tinha de perder a mãe? A boneca da filha de Nina, que desaparece em determinado momento da história causando um auê dos infernos? As interpretações são muitas e ainda não me decidi qual delas adotaria? Nenhuma? Ou seria, todas elas?


Indico para todo mundo que tem vontade de conhecer a escrita de Elena Ferrante. É um ótimo jeito de começar. Indico também para quem curte adaptações literárias.


Isso porque, o livro foi adaptado para filme e está disponível na Netflix.

Eu assisti e, posso dizer, que mais fiel seria impossível. Apesar de duas obras distintas, o filme traz todo o sentimento do livro para as telas. Quem leu, vai conseguir ler nos olhos de Leda seus pensamentos mais profundos. Quem não leu, vai perder muito pouco da essência da história contada no livro. Minha única reclamação vai para a americanização dos nomes. Por que raios as pessoas não podem continuar com o nome que lhes foi dado no livro?


Deixo abaixo o trailer para assistirem! Se já tiver lido e assistido, me contem o que acharam!





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Avaliação (1 a 5) 3.5





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